Thursday, October 30, 2008

Entrevista Echidna

NÃO ACORDEM A “BESTA” ADORMECIDA

Um ano e meio separam os lançamentos da demo “Tearing The Cloth” do álbum “Insidious Awakening”. Os vila-novenses Echidna parecem ter envergado, rigorosamente, o “fato-macaco” neste curto período de tempo, pois a evolução que agora registam com o seu álbum de estreia é admirável. É verdade que a dedicação e uma intensa actividade ao vivo potenciam o crescimento de uma banda, mas seria igualmente retirar-lhes mérito se disséssemos que tudo foi construído “mecanicamente”. Pelo aspecto sonoro de “Insidious Awakening”, os Echidna comprovam que para além de serem uma máquina muito bem oleada, são também um organismo com talento inato. Se é sempre relativa e escusada a discussão sobre a validade de um estilo ou sobre o seu timing de existência, é preferível então – e mais justo – avaliarmos a qualidade de um trabalho dentro da sua esfera criativa. E sem preconceitos, consideramos os Echidna uma mui digna banda de death/thrash metal com aquilo que muitas bandas estrangeiras têm e que muitas não têm. O guitarrista David Doutel revelou-nos a receita para tanta consistência.

Sete anos de existência e só ao fim de quatro é que fizeram a vossa primeira aparição ao vivo. Porquê?
Esse é, de facto, um ponto importante no que respeita ao percurso da banda. Achámos, acima de tudo, que seria fundamental dar tempo para podermos crescer e ganhar maturidade suficiente, sem a pressão que um concerto ou um registo implicam. Crescer como banda e músicos pareceu-nos sempre fundamental no que respeita a todo o futuro de um projecto em que acreditamos e para o qual trabalhamos com a maior dedicação possível.

Este momento, para além de ter sido o vosso primeiro espectáculo, certamente foi marcante por ter ocorrido, precisamente, no mítico Hard Club. Quer recordar-nos esse momento?
Foi, sem dúvida alguma, um momento marcante. Não só pelo facto de ter sido o primeiro concerto, mas também, como referiste, por ter acontecido no Hard Club. Foi um concerto envolto numa grande dose de nervosismo, uma vez que era a primeira vez que pisávamos um palco enquanto banda. Não vamos, certamente, esquecer esse momento, pois foi o início de todo este processo de relacionamento entre público e banda, que correu da melhor maneira possível, oferecendo-nos a motivação e confiança suficientes para tudo o que se seguiu. O nervosismo, esse desapareceu ao fim do primeiro acorde...

Ao que tudo indica esta sala regressará numa nova infra-estrutura brevemente na cidade do Porto. Sendo do norte, isto alegra-o particularmente? Está ao corrente de como está o projecto?
Sim, sem dúvida. Qualquer músico residente no distrito do Porto [e não só] terá todo o interesse em acompanhar o projecto. Pelo que sei este ficará situado no interior do Mercado Ferreira Borges, bem no centro da cidade. Acima de tudo, enquanto músicos, temos a esperança de que se mantenham as excelentes condições acústicas que a antiga casa oferecia. O Hard Club foi um marco na história da música em Portugal, pelo que faz falta tanto às bandas como ao público. Da nossa parte, esperamos que a reabertura esteja para breve.

Se é, por um lado, curioso que tenham atravessado um período relativamente longo de gestação até se exporem ao vivo, não é menos curioso que o processo entre a gravação da vossa primeira demo e do vosso primeiro álbum tenha sido bastante rápido. Como explica que as coisas tenham corrido assim?
Acho que foi, principalmente, o resultado natural da evolução dos processos de composição e execução. O tempo que “perdemos” até ao lançamento de “Tearing the Cloth” foi compensado com o entendimento e experiência que tivemos na criação de “Insidious Awakening”. Neste sentido, creio que este tempo curto entre um lançamento e o outro acaba por ser um reflexo da nossa preocupação em maturar, sem pressões, antes da exposição ao vivo. Para além deste aspecto surge também de forma algo inevitável a nossa motivação relativamente ao desafio que é compor um LP, que acabou por ser um modo de exigirmos mais de nós próprios, com um propósito válido e motivante.

Mas, concretamente, como acham que brotou essa evolução natural?
Acho que há um aspecto fundamental a referir relativamente a esta questão, que se prende com a experiência adquirida com actuações ao vivo no período que antecede e sucede o lançamento de “Tearing the Cloth”. Aprendemos imenso com as prestações ao vivo, ganhamos muita motivação e, acima de tudo, permitiram-nos perceber o caminho que queremos seguir. Nesse sentido, o ano que passou entre um lançamento e o outro foi extremamente rico em termos de aprendizagem. Compor e gravar o álbum foi apenas um resultado óbvio desse período mais intenso de trabalho em conjunto.

Até agora não há como a banda se possa sentir desiludida com o lançamento de “Insidious Awakening”, imagino. Até agora muitos o consideram uma das revelações nacionais do ano. Como têm vivido todo este entusiasmo em redor da banda?
Temos vivido este momento com enorme prazer e sensação de gratificação. Acaba por ser algo que resulta de todo o trabalho que desenvolvemos até aqui, o que nos enche de orgulho e motivação para continuarmos. Sabemos que o que queremos fazer é mais ainda e de modo algum este entusiasmo serve para nos ficarmos por aqui. Acreditamos que temos ainda muito para dar à musica e que temos muito trabalho pela frente. Este momento presente serve, acima de tudo, para nos dar força para continuar com este projecto. Ainda assim, temos plena consciência da responsabilidade que advém de tudo isto, fazendo crescer a pressão de um segundo álbum, o que por um lado pode funcionar positivamente no que respeita à exigência que temos para connosco.

O som dos Echidna será de fácil exportação ou por outro lado, devido à forte concorrência, dá-se o cenário de poderem ficar algo encobertos em termos mediáticos?
Creio que, salvo raras excepções, é complicado para qualquer banda conseguir exportar o seu trabalho. Os mercados estão a funcionar de maneira bastante diferente, já que existem novas dinâmicas criadas, principalmente, com o aparecimento de espaços virtuais como o Myspace. Neste momento, creio que se torna fundamental aproveitar todas estas novas ferramentas, perceber no que é que nos podem ajudar e partir em definitivo para a exportação da música que praticamos. Neste momento e com as excelentes críticas que temos recebido pela Europa, creio que estão abertas as portas para a exportação. No entanto, este é um passo que requer um grande esforço da nossa parte, principalmente no que respeita à auto-promoção e angariação de novos fãs da música que praticamos. Acima de tudo, sem público lá fora, dificilmente se consegue exportar com sucesso.

Estou convicto de que a banda estava ciente de que ao praticar o som que está a praticar pudesse vir a viver o estigma de um modelo, actualmente, desvalorizado e estereotipado. Preocupa-vos o vosso futuro por esta razão?
Não, de modo algum. A gravação deste álbum, como referi anteriormente, foi assente, fundamentalmente, na honestidade e sinceridade que queríamos garantir estarem presentes. Nesse sentido, não sentimos que isso possa prejudicar em nada o nosso futuro. Temos ainda tempo para crescer mais, para aprender e melhorar tudo o que fomos fazendo e, acima de tudo, temos plena tranquilidade ao pensar que gravámos aquilo que nos apetecia sinceramente gravar. O que aí vem não podemos adivinhar, podemos sim continuar a trabalhar e daqui para a frente explorar mais e melhor o universo do death/thrash que, por si só, está longe de estar saturado em termos de variedade musical. Todos os géneros vivem de ciclos de maior e menor adesão do público. O death/thrash teve o seu esplendor mais recente aquando do despoletar de inúmeras bandas na Suécia, mas a continuidade e sucesso desta sonoridade não está nem nunca esteve em causa.

Mudar seria, a partir daqui, uma grande falta de honestidade… ou não? É curioso, porque a partir do momento em que uma tendência se desvanece é supostamente a partir daí que se desvenda quem andou a deambular, pelos mais variados interesses, por uma vertente musical. Isto sem querer ser conservador, pois defendo também fortemente a renovação e evolução… O que pensa deste assunto?
Sim, seria um enorme revés naquilo que é a nossa forma de estar na música. Como já referi, pretendemos, acima de tudo, ser sempre sinceros naquilo que fazemos, nunca perdendo o enorme prazer que sentimos nas actuações ao vivo e mesmo nos ensaios. Nesse sentido, mudar seria bastante estranho no nosso percurso. O que posso dizer relativamente a isto é que, de facto, tudo evolui, tudo se renova e nós não fugimos à regra, apesar de termos bem presente que o universo death/thrash é aquele onde nos sentimos bem e servirá sempre de base para a nossa criação. Há muitas outras coisas que podem ser exploradas, sem correr o risco de perder a identidade da banda. Para um próximo trabalho, queremos pensar este género de maneira diferente, com uma abordagem mais própria, trabalhando alguns aspectos que durante as gravações de “Insidious Awakening” fomos percebendo de maneira diferente. De resto, acho que o processo de gravação é extremamente importante precisamente aí, na possibilidade que dá à banda de se autoavaliar, de perceber como soa o seu trabalho. Logo, um segundo álbum será sempre uma evolução, como o foi da demo para o LP.

Até que ponto Daniel Carvalho foi importante na produção deste novo trabalho? A lição estava toda muito bem estudada antes de entrarem em estúdio ou muita coisa foi mudada e melhorada pelo dedo do produtor?
Planeámos este álbum bastante bem antes de entrarmos em estúdio. Sabíamos perfeitamente o que queríamos dele, que assentava, essencialmente, na honestidade e sinceridade do trabalho desenvolvido. Queríamos que o álbum soasse verdadeiro e representativo do enorme prazer que sentimos enquanto músicos e enquanto banda. Partimos para o estúdio com tudo bem planeado em termos de composição, deixando apenas alguns momentos em aberto, pois parece-nos importante esse lado da improvisação que acaba por dar ao álbum esse toque menos mecânico e rígido. A participação do Daniel Carvalho foi, ainda assim, fundamental, pois acreditamos que é importantíssimo o ambiente de convívio e naturalidade entre banda e produtor, que permite pensar as coisas de uma forma menos pressionante e, acima de tudo, dá a possibilidade ao músico para se exprimir na sua totalidade. O Daniel tem uma relação bastante próxima connosco, aproveitando isso mesmo para puxar por nós em termos de execução. Mesmo na parte da composição, houve vezes em que discutimos com ele algumas das opções tomadas, o que para nós é extremamente importante uma vez que o Daniel ofereceu, em primeira instância, uma perspectiva exterior.

Recentemente participaram no Alliance Fest. Que balanço fazem desta experiência?
Foi uma experiência bastante positiva, principalmente no que respeita à aceitação do público perante o nosso trabalho. Foi a primeira vez que actuamos em Lisboa e podemos afirmar que correu da melhor maneira. A oportunidade de partilhar o palco com bandas como Arch Enemy ou Anathema, foi bastante enriquecedora, pois acabamos sempre a aprender alguma coisa com o contacto de proximidade neste tipo de eventos. Relativamente ao festival em si, acabou por se transformar numa excelente oportunidade para nós em termos de divulgação, já que raramente temos presentes tantos meios e canais de comunicação num mesmo local. Aproveitámos o melhor que conseguimos esta oportunidade e, acima de tudo, ficámos com a sensação de dever cumprido para com o público que presenciou o nosso concerto.

Para breve prevêem uma promoção mais massificada a “Insidious Awakening” ao vivo. Há alguma surpresa nesse sentido?
Sim, estamos, neste momento, a promover o álbum na digressão “No Lenience Tour”, tentando passar um pouco por todo o país. Não sendo essa uma tarefa fácil, fica já anunciado que a partir de Fevereiro de 2009 daremos início à segunda parte da digressão, tentando chegar a outras cidades pelas quais, infelizmente, ainda não passámos. Em estudo está também a possibilidade de partirmos para a Europa, mais concretamente para a Alemanha, pela excelente aceitação que “Insidious Awakening” tem tido por lá, tanto no que respeita à crítica especializada como ao público em geral.

O que acha que está a tornar os trabalhos das bandas portuguesas cada vez mais profissionais? A logística das gravações e/ou a sua mentalidade e métodos de trabalho?
Creio que se deu, nos últimos tempos, uma enorme revolução nos processos de gravação, muito por culpa da evolução do universo digital da música. Hoje em dia temos mais produtores, que estão a aparecer numa espécie de nova geração, o que tem permitido às bandas encarar uma ida para estúdio com maior seriedade e noção de que os resultados podem ser excelentes em termos de produção. Nem sempre foi assim, pois uma gravação analógica profissional implicava custos muitas das vezes excessivos para bandas que se queriam lançar, fazendo com que centenas de bandas, provavelmente, tenham ficado pelo caminho muito por culpa da produção e qualidade áudio do registo. Mas este facto não justifica tudo, acho que parte da “culpa” deste fenómeno positivo na música nacional parte também das bandas, que passaram com os novos meios de comunicação e exportação de música, a apostar de uma forma mais séria nos seus trabalhos, mas, mais uma vez, acaba por ser o universo digital a permitir alcançar públicos e mercados que anteriormente eram pura e simplesmente miragens.

No caso dos Echidna, sob que métodos e com que frequência praticam os vossos instrumentos ou ensaiam em conjunto? Este é também um factor importante…
Neste momento, ensaiamos regularmente para manter o nível máximo de profissionalismo ao vivo que queremos sempre apresentar. Presentemente, e já que nos encontramos em digressão, torna-se fundamental aproveitar todas as oportunidades possíveis para ensaiar e preparar os próximos concertos, com o intuito de oferecer ao público o máximo que conseguimos enquanto músicos e banda. Relativamente aos instrumentos, creio que isso já se tornou um hábito diário, que raramente não acontece. Acima de tudo, gostamos e sentimos prazer a tocar, pelo que acaba por ser natural o nosso contacto constante com os instrumentos que cada um toca.

Que principais aspectos entende que serão precisos os Echidna trabalharem para se manterem em alta e rumarem a uma grande carreira?
Será fundamental continuar a acreditar neste projecto como sempre acreditamos, não sacrificando nunca o prazer que sentimos. Depois... há quase tudo para fazer. Em termos de promoção, achamos que este álbum pode ainda oferecer-nos algo mais, principalmente a nível internacional, que é algo em que estamos a trabalhar presentemente. Em termos de futuro da banda, temos a certeza que há ainda muito para explorar e aprender, pelo que o que pretendemos, sobretudo, é dar continuidade ao trabalho que temos vindo a desenvolver e, esperançosamente, continuar com o percurso ascendente que temos vivido até aqui. Para isso, será preciso trabalhar individualmente em primeira instância e depois como banda, aumentando o desafio da composição e explorando novos caminhos. Depois de tudo isso, será preciso um enorme esforço de promoção do nosso trabalho que, actualmente, parte, principalmente, das próprias bandas e das pessoas que vão acompanhando o projecto. Lançámos, recentemente, a Street Team oficial dos Echidna no Myspace, o que nos parece um conceito excelente, uma vez que cria um espaço com uma dinâmica interessante para todos aqueles que nos querem ajudar a crescer.

Já agora, há um grande sonho a sustentar o vosso trabalho ou pela forma como o mercado está, lotado, trabalham sem sequer criarem grandes expectativas e muito menos a pensar em viver da música?
Temos grandes expectativas relativamente ao nosso trabalho. Viver da música é, sem dúvida, um dos objectivos, mas não vivemos obcecados com essa ideia. Acima de tudo, para já, os nossos objectivos passam por dar a conhecer o nosso trabalho ao maior número de pessoas possível. Mas respondendo directamente à pergunta... sim, sonhamos bastante alto, o que consideramos fundamental no estabelecer de padrões elevados para o projecto e, principalmente, potenciador de motivação suficiente para não desistirmos.

Nuno Costa

1 comment:

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