Wednesday, September 10, 2008

Entrevista Krisiun

TUMULTO LATINO

18 anos de carreira percorridos com a consistência e sagacidade dos brasileiros Krisiun é algo que regista poucos paralelos hoje em dia. A sua veloz e técnica abordagem ao death metal é capaz de convencer qualquer amante de música extrema com uma eficiência desarmante já que esta autêntica máquina debulhadora praticamente não mostra falhas. Para dar seguimento a álbuns estrondosos como “Works Of Carnage” ou “AssassiNation”, o trio implacável de Ijuí oferece-nos em 2008 “Southern Storm”, mais um assalto transgressor aos nossos sentidos. Comprovada a sua forma inexorável, era merecido que falássemos com Alex Camargo [voz e baixo] sobre o regresso de uma das bandas mais categóricas do actual death metal técnico mundial.

Como podemos situar este novo disco dos Krisiun num plano de evolução na carreira do grupo?
Bom, esse novo disco mantém os elementos que fazem parte dos Krisiun, ainda que num processo natural de evolução. A música é rápida e brutal, mas pode-se entender as composições e o trabalho aplicado. Conseguimos tirar um som ainda mais pesado e visceral. Estamos bem satisfeitos com o resultado final.

Prestes a atingir os 20 anos de carreira… Que metas estabelecem a cada vez que lançam um trabalho?
Queremos estar sempre evoluindo, fazer do death metal um estilo respeitado, gravar álbuns e trazer algo de novo. Queremos também estar em tournée e tocar em lugares em que ainda não tocámos. Enquanto tivermos motivação e saúde vamos estar fazendo muito “barulho”.

Embora todos estejamos cientes da crise que vive a indústria discográfica, pode dizer-se que é satisfatório o sucesso comercial dos Krisiun, atendendo ainda às contingências de um estilo tão alternativo como o vosso?
Acredito que sim. Já são cinco discos pela mesma gravadora... Hoje em dia todos têm que se adaptar à maneira como as coisas funcionam, principalmente em relação à internet...

Porque acha que são tão bem sucedidos e respeitados hoje em dia? Acha que existe algo mais da parte do público do que a admiração pelas vossas substanciais capacidades técnicas?
Acredito que seja uma combinação de todos os aspectos, principalmente o musical. Esse
estilo exige seriedade e dedicação. Estamos sempre concentrados e motivados em tocar death metal e isso o público entende. Existem milhares de bandas, mas poucas conseguem passar uma mensagem e uma música real e convincente.

O percurso dos Krisiun assemelhou-se a um “calvário”, digamos assim, até chegarem aonde chegaram ou a banda sempre teve alguns privilégios no seu processo de ascensão mediática por alguma razão? Ou seja, dispuseram, por exemplo, daquelas ajudas fulcrais [contactos privilegiados com pessoas do show biz] ou tiveram que suar por cada “grama” do vosso actual sucesso?
O começo é difícil para todos. Passámos por dias muito difíceis no começo da nossa carreira, mas nunca desistimos. Com o passar do tempo vão-se conhecendo pessoas que se interessam pelo teu trabalho... Temos grandes amigos na música, mas nunca tivemos privilégios de bandas “compradas”. Sempre lutámos por nós mesmos, usando a nossa inteligência e garra. Mas é claro que tivemos a ajuda de grandes amigos que foram fundamentais.

Hoje em dia será que podemos dizer que são especialmente venerados no Brasil?
Temos um grande público no Brasil. Gostamos muito de tocar no nosso país, mas existem lugares tão bons quanto o nosso. O Brasil é um país de altos e baixos e também na música existe um movimento modista e descartável, assim como uma boa “cena” de Metal.

Então podemos dizer que a mediatização que o grupo alcançou não fez com se gerasse algum orgulho ou inveja no povo brasileiro no sentido de não conseguir assumir que um compatriota seu se está a dar bem no seu ofício? O povo é então unido e não se aplica o ditado: “Santos da casa não fazem milagres”?
Eu acredito que isso exista no mundo inteiro; boas e más pessoas. Muitas falam e têm opiniões sobre o que não entendem ou não gostam, mas temos orgulho do nosso país e território… e das dezenas de maníacos que têm o nome dos Krisiun tatuado no seu corpo.

Há, por exemplo, quem vos considere os novos “embaixadores” do Heavy Metal brasileiro após o desvanecimento dos Sepultura. O que acha desse comentário?
Obrigado aos que nos consideram assim. Sepultura foi o maior nome do Brasil e um dos maiores do mundo. Penso que jamais uma banda latina atingirá o mesmo sucesso deles, em todos os aspectos. Os Krisiun lutam pela sua existência há muitos anos com competência e dedicação. Ficamos gratos a todos os que apreciam a nossa arte.

Eu iria mais além e perguntava: encaram com naturalidade o facto de serem hoje apontados como uma das maiores bandas de death metal do mundo ou há sempre aquele espanto do género: "Eu antes era fã de “X” banda e agora partilho o palco com eles e até sou amigo deles. Que cena incrível!"
Existem os dois lados; temos a convicção de que fizemos dessa banda uma realidade e, por outro lado, apreciamos todos os momentos marcantes da sua carreira. Na maioria das vezes estamos sempre motivados para tomar uma cerveja e celebrar novos passos.

Há pouco falávamos em Sepultura… Não será pelo seu período actual menos áureo que os Krisiun deixaram de os apreciar e respeitar, certo? Afinal de contas “Refuse/Resist” foi a cover escolhida pelos Krisiun para incluir no seu novo disco. O que simboliza, na verdade, esta cover?
Sempre fomos fãs e admiradores dos Sepultura. O verdadeiro propósito dessa cover foi trazer um pouco da atmosfera que eles passavam naquela época. Aqueles foram os dias em que os ''manos'' se juntaram às maiores bandas do mundo. Foram dias de muito orgulho para o underground brasileiro.

Está, por exemplo, minimamente a par do movimento underground português? Sabe quais são os seus principais handicaps?
O primeiro nome que me vem a cabeça é Moonspell. De resto, conheço também Seven Stitches, Spoiled Fiction, entre outros.

Digo-lhe que, por exemplo, o público português está cada vez menos empenhado no apoio ao Heavy Metal. Existe muita gente que apoia o movimento, mas depois existem os outros apoiantes “fracturados” que num dia vestem uma “camisola” e no outro dia outra, e isto depois marca toda a diferença neste ciclo que, como é natural, tem muito de comercial e precisa de números para subsistir. O que tem a dizer sobre isso? Encontra algum paralelo entre este cenário e o brasileiro?
Como já referi atrás, isso acontece no mundo inteiro. Já vi muitos aparecerem e desaparecerem da noite para o dia. A cena musical é corrompida em vários aspectos e isso reflecte-se no público. Por outro lado, acredito que a magia do Metal jamais morrerá. Sempre haverão pessoas interessadas no Metal ao invés do lixo da Rádio e da TV.

Nos últimos anos, a vossa actividade na estrada tem sido cada vez mais intensa. Tem sido difícil lidar com isso ou os Krisiun são mesmo amantes deste tipo de rotina? Afinal de contas, são só três e o facto de passarem tanto tempo numa tourbus pode criar algum tédio…
Temos que estar sempre motivados naquilo que fazemos, senão qualquer coisa pode-se tornar tediosa. Existe a rotina das viagens, papéis, burocracia, mas os espectáculos são a compensação!

Na estrada há sempre muitos episódios por contar. Quer partilhar algum?
Já vi muitas coisas bizarras... Uma vez vi um puto a comer o seu próprio vómito; outra vi um puto beber a urina de outro puto, entre outras loucuras!

A vossa recente passagem por Portugal pelo festival Metal GDL marcou-vos de algum modo especial?
Certamente. Foi um grande show e também foi a primeira vez que tocámos num festival em Portugal. A estrutura, em geral, foi nota dez. Esperamos poder voltar. Muito obrigado ao ''Bixo'' e a toda a produção.

Na rotina de trabalho dos músicos dos Krisiun há sempre uma preocupação muito grande em aperfeiçoarem-se tecnicamente? Por exemplo, complementam os ensaios com exercícios físicos de alguma espécie?
Sim, todos gostamos de exercícios físicos. Esses ajudam-nos muito no dia-a-dia e no desgaste das tournées. Fazemos exercícios básicos, kickboxing, futebol… Nada exagerado, não somos atletas. A mente é o melhor instrumento.

O desgaste físico é muito sentido por tocarem sempre tão intensamente?
Sim, com certeza há desgaste físico, principalmente nas tournées. Essa é a hora de usar a mente e tentar relaxar ao máximo. No ano passado, no fim da tournée do “AssassiNation”, fizemos praticamente 55 concertos em dois meses. No final deste período parecia que estava “queimado”, com os ossos partidos. É muito importante voltar para casa e recarregar baterias.

Em termos líricos, “Southern Storm” reza sobre que temas?
“Southern Storm” reflecte os nossos pensamentos e transmite as mensagens que queremos passar com a nossa música. Não estamos presos a um determinado tópico. Abordamos assuntos brutais, assim como a nossa música. A conquista do eu próprio e do mundo exterior, escritas sumerianas e o princípio do caos; a realidade das guerras e da falência da humanidade, o fanatismo religioso e sua decadência, etc.

De alguma forma, pode-se dizer, e isso sem qualquer tipo de sentido negativo, de que já pouco se poderá esperar musicalmente dos Krisiun? Nos vossos trabalhos parece sobrepor-se uma atitude inabalável e a fidelidade para com os seus fãs “die-hard” à hipotética inovação ou experimentação. Será esta uma apreciação com algum fundamento?
Bom, um trabalho é sempre falado ou questionado, sempre foi assim a cada disco Ainda assim, acredito que os Krisiun sempre trouxeram algo de novo em todos os discos, especialmente no último, embora quem vá julgar seja o público. Enquanto os Krisiun existirem vão estar empenhados em ajudar a fazer desse estilo algo forte e renovado, diga-se o que se disser.

Permanecem sem nenhuma sedução por mudar ligeiramente o vosso som? Todavia, isso poderia representar uma tentativa de seguir alguma tendência ou venderem-se “espiritualmente” digamos assim… Ou não?
Já se passaram incontáveis tendências, mas não embarcámos em nenhum vagão e jamais o iremos fazer. Death metal para nós é um estilo de vida e não um hobbie. Ninguém é dono da verdade, só o tempo poderá dizer quem realmente faz desse estilo uma realidade.

O disco já saiu há algumas semanas. As reacções têm sido as que esperavam?
Têm sido muito boas, melhor do que as que esperávamos. Algumas revistas ''grandes'' que diziam merda sobre nós agora estão falando bem.

E na estrada, esperam-nos algumas surpresas?
Mulheres bonitas, bons amigos, boa marijuana, cerveja gelada e muito metal! Obrigado aos amigos portugueses e à SounD(/)ZonE.

Nuno Costa

www.krisiun.com.br

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