Friday, August 21, 2009

Entrevista Despised Icon

DIAS DE EXTERMÍNIO

Apesar de se torcer o nariz quando se fala de tendências, o deathcore é uma delas, a verdade é que há sempre quem marque a sua posição de forma extremamente honesta e convincente. Um desses casos é o dos Despised Icon. Sete anos de muito trabalho, quatro discos, um DVD e muitos milhares de quilómetros “queimados” à estrada, fazem deste portento de música extrema do novo milénio um caso inegável de qualidade. A banda oriunda de Montreal, no Canadá, apresenta duas caras novas na sua formação e uma sonoridade ainda mais técnica, rápida e com uma nova abordagem à melodia… sempre de contornos dementes. “Day Of Mourning”, a editar a 22 de Setembro pela Century Media, foi o pretexto para a agradável conversa que tivemos com o guitarrista Eric Jarrin.

Após dois discos com o mesmo line-up, apresentam duas caras novas. Como descreve o papel que tiveram em “Day Of Mourning”?
Na verdade, quando eles se juntaram à banda a maior parte do disco já estava escrita. Mesmo assim, eles tiveram oportunidade de contribuir. O Ben [guitarrista] escreveu praticamente um tema e o Max [baixista] trouxe alguns riffs que acabámos por usar aqui e ali durante o disco. Apesar da maior parte da composição ser assegurada pelo Alex [baterista], pelo Erian [voz] e por mim, estamos abertos a receber ideias dos nossos colegas.

Quando muita gente podia pensar que viviam da música, o Sebastien Piché [baixista] abandonou a banda por imposições do seu emprego diário. É fácil pensar-se que com tantas digressões e discos lançados mundialmente muita banda consegue dedicar-se só à música…
É um mito. Se querem viver do Metal é melhor que consigam vender centenas de milhares de discos e fazer digressões nove meses por ano. Tocar música extrema como a nossa não é uma boa “máquina” de fazer dinheiro. Em primeira instância fazemo-la por amor e diversão e então depois se fazemos digressões ganhamos dinheiro decente, mas nunca vi um único cêntimo de um disco que vendemos. O Seb acabou de comprar uma casa e tem um bebé para criar, daí que estar em digressão deixasse de ser possível.

Certamente continua a contactar com ele. Está conformado com o facto de ter saído?
Sim, continuo a falar com ele e com o Yannick [guitarrista]. Eu penso que ambos chegaram à conclusão que era impossível fazer as duas coisas ao mesmo tempo: estar em digressão e sustentar uma família. Talvez seja possível quando facturas milhares de dólares, mas esse não é o nosso caso. Portanto, eles tomaram a opção de sair. Eu sei que às vezes eles sentem falta do estilo de vida da banda, mas têm outras coisas a dar-lhes alegrias na vida – as suas esposas e filhos.

Talvez estejam agora empenhados em tornar os seus filhos nos melhores músicos possíveis!
O Seb tem uma filha e o Yannick teve o seu segundo filho em Abril. Mas sim, talvez esta venha a ser a segunda geração dos Despised Icon! [risos]

O Maxwell Lavelle é um baixista com características um pouco diferentes das do Sebastien. Como o descreve?
O Maxwell é um grande baixista. Embora ele toque com os dedos, o que altera um pouco o nosso som comparativamente ao que era com o ataque de palheta do Seb, ele trouxe uma nova abordagem à banda. Ele gera um som verdadeiramente pesado, o que me agrada. Acreditem ou não, mas quando ele toca com metade da intensidade, juntamente com a rapidez da bateria, cria um som geral muito bom, muito cheio.

O Yannick costumava a produzir os vossos álbuns. Era uma mais-valia. Como aconteceu dessa vez?
Como sempre. Fomos para estúdio com ele meio preparados, assustados os primeiros dias e depois as coisas começaram a engrenar e tudo correu bem. Claro que o Yannick é uma grande valia. Ele esteve na banda durante cinco anos, portanto, sabe quando algo não está bem. Ele também está apto a dar o seu contributo sem alterar as características do som dos Despised Icon, porque sempre fez parte dele.

Também o Alan Glassman [guitarrista] saiu recentemente… para se juntar a outra banda! Foi o culminar de algo que não estava bem?
O Alan esteve na banda apenas um ano e meio. Durante esse período não tivemos qualquer incidente. O seu verdadeiro contributo foi dar-nos a conhecer o Max. Ele costumava tocar com o Alan nos Goratory e revelou-se uma grande aquisição. Espero que o Alan esteja contente com a sua nova banda.

Como referi anteriormente, acho-vos uns “devoradores de asfalto”. O “Day Of Mourning” foi até, provavelmente, escrito na estrada…
Este foi um dos primeiros álbuns que escrevemos quase na íntegra enquanto estávamos em digressão. Foi um desafio, uma vez que, normalmente, escrevemos os nossos discos no conforto dos nossos lares e esperamos que a inspiração nos surja. Tive que levar comigo um computador e uma placa de som externa com os quais gravei guitarras e programei baterias. Digamos que escrevemos metade do álbum dessa forma. Isso permitiu dar um feeling muito mais cru e bruto ao nosso novo material.

Com tanto tempo na estrada era previsível que, mais cedo ou mais tarde, surgisse um DVD. “Montreal Assault Live” foi lançado em Março deste ano. Quer apresentar-nos?
Este DVD consiste num espectáculo de uma hora que demos na nossa terra natal. Foi captado por 11 câmaras e masterizado em surround 5.1. É um concerto muito fixe. Vem acompanhado de um documentário de uma hora incluindo entrevistas, filmagens de bastidores e muito material engraçado.

O conceito do vosso novo trabalho parece bastante mais obscuro, até se olharmos para o seu título. Que sentimentos vos demoveram durante a sua escrita?
Muitas coisas mudaram durante este e o anterior álbum. Experienciámos muitos sentimentos, especialmente o desgosto… quando perdes alguém, quando algo de mau acontece. É uma constante na vida. Afliges-te quando perdes seja o teu trabalho, um amigo, uma relação, um membro de banda… portanto, o “Day Of Mourning” anda à volta desses temas, nos quais penso que muitas pessoas se podem rever.

Em termos musicais, penso que injectaram também um pouco mais de melodia, por estranho que isso possa parecer, atendendo à vossa imperativa agressividade. Contudo, penso que, em pequenas doses, “Day Of Mourning” é diferente dos seus antecessores. Mais técnico até…
Estás correcto. Por qualquer razão este álbum é ligeiramente mais melódico e técnico. Penso também que seguimos uma abordagem mais intensa. As partes mais rápidas estão ainda mais rápidas e os breakdowns mais pesados. Porém, as melodias em questão não são daquelas suaves e tocantes, mas sim “maléficas”.

Embora o deathcore tenha entrado em voga e muitas bandas o façam, continuam a ter uma marca muito particular no vosso som. Penso que se reconhece o vosso som à distância e são já daquele tipo de banda de culto no underground…
Obrigado pelo reconhecimento. Contam-se já cerca de nove anos desde que escrevemos o primeiro riff dos Despised Icon. Penso que já tivemos tempo para forjar e aperfeiçoar o nosso som. É isso que provavelmente faz com que as pessoas nos reconheçam facilmente. Tentamos também criar temas e não fazer apenas copy/paste de riffs. Pode parecer fácil, mas não é. É preciso bastante experiência musical para fazer isso bem.

Digamos que a forma dedicada e honesta como trabalham também marca a diferença?
Penso que temos vozes e secções de bateria muito distintas. O Alex “Grind” é um baterista fora de série. Há poucos que conseguem fazer o que ele consegue. Por outro lado, como já disse, concentramo-nos muito nos arranjos das músicas. Talvez por isso soamos um pouco diferentes de todas as bandas que apenas colam riffs uns aos outros. Desde o nosso começo que nos demarcamos pelo nosso trabalho árduo e honesto, mas não sei como é que acontece em relação às outras bandas. Sempre encaramos as coisas passo-a-passo e tem funcionado.

Será, certamente, desgastante, tanto física como psicologicamente, manter os níveis de desempenho altos face à exigente velocidade e complexidade dos vossos temas. Como fazem para gerir isso?
A maioria de nós é experiente e aprendeu o que fazer para manter os níveis de desempenho altos. O Alex refere-se muitas vezes ao controlo e ao facto de tentar ser o mais relaxado possível mesmo quando está a tocar no topo da sua velocidade. O mesmo acontece comigo. Tento racionalizar a minha energia por forma a não sacrificar a minha performance.

A Europa já é como que uma segunda casa para vocês?
Sim. Aliás, o Quebec é como que uma pequena Europa no norte da América. Portanto, sentimo-nos muito confortáveis e bem-vindos quando vamos à Europa. A comida também é muito boa. Adoramos o catering!

Vocês são bastante íntimos dos Ion Dissonance. Quando li sobre isso, ocorreu-me logo aquele espírito saudável de ajuda mútua entre bandas do underground. É assim também que as restantes bandas do Canadá lidam entre si?
Não sei como as coisas são em relação às outras bandas canadianas, mas entre os Ion Dissonance e os Despised Icon as coisas funcionam quase como uma família. O Antoine, o guitarrista deles, é primo do Alex e o seu vocalista e baterista são colegas de quarto do Alex Erian [vocalista]. O Gab, antigo guitarrista dos Ion Dissonance, é também um amigo muito próximo de nós. Na verdade, tivemos o Gab e o Kevin, actual vocalista dos Ion Dissonance, a participar em dois temas de “Day Of Mourning”.

Sabe alguma coisa em relação a um novo trabalho dos Ion Dissonance? O “Minus The Herd” já data de 2007…
Sei com certeza que já pararam de andar em digressão. Estão sem contrato desde que a Abacus Recordings fechou as portas. Actualmente, estão a trabalhar em temas novos mas não sei se já os começaram a gravar. São grandes músicos!

No meio disso tudo, penso que o que está verdadeiramente mal é os Despised Icon ainda não terem actuado em Portugal! Têm que “esmurrar a mesa” e dizer: queremos tocar em Portugal!
De facto, tivemos algumas propostas. Estamos sempre abertos a tocar aí mas os promotores acabam sempre por cancelar os concertos ou retraem-se. Portanto, acho que está nas mãos dos nossos fãs portugueses fazer ver aos promotores locais de que vale a pena agendar um concerto nosso. E comprem bilhetes com antecedência.

Nuno Costa

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